segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Respostas as objeções formuladas pelos céticos

D - Porque a percepção não é capaz de apreender o objeto por inteiro numa só vez e mesmo instante?

M - Porque os objetos apresentam qualidades distintas. Assim a natureza dispoz o organismo humano para concentrar-se cada uma delas (trabalho de especialização); associadas no entanto ou recompostas pelo intelecto elas apresentam o objeto em sua multipla integralidade ou totalidade.

Caso tomemos os animais uni ou monocelulares, percebemos que em alguns deles receptores de luz, odores e ondas sonoras encontram-se como que disseminados por todo 'corpo', predominando no entanto - caso tomemos por referência o grupo como um todo - o tato, igualmente difuso pelo corpo. Então podemos falar numa aesthesis mais ou menos difusa ou espalhada pelo ser em questão ou numa aesthesis genérica.

Naturalmente que esta capacidade é apta para facilitar a sobrevivência daquele individuo, espécie ou grupo mas não para conhecer o mundo em sua inteireza.

Aos poucos, no entanto, o processo evolutivo implementou o que denominamos especiação sensorial dispondo para cada qualidade externa apresentada pelos objetos um orgão sensorial receptor bem distinto dos demais e por assim dizer adequado. Segundo percebemos a presença de olhos, narizes e lingua; nos insetos, peixes, anfíbios, répteis, aves, etc

Grande número de cientistas admite, inclusive, que o grupo dos mamíferos possui os orgãos sensoriais mais evoluidos e melhor capacitados.

Do ponto de vista biológico podemos dizer que no campo da percepção sensorial o homem esta muito bem provido ou contemplado, caso desejemos compara-lo com os répteis, anfíbios, peixes ou moluscos. Mesmo em se admitindo que particularmente esta ou aquela espécie possua um orgão mais aguçado, o homem parece prevalecer do ponto de vista do conjunto.

Nenhum outro animal parece possuir um conjunto de órgãos ou aparelho sensorial, no mínino, medianamente satisfatório.

Eis porque a atuação conjunta dos sentidos, parece estar disposta para informar-nos validamente sobre certos aspectos do ser ou do objeto externo numa escala superior aos demais niveis de percepção com que nos deparamos no restante do mundo natural. Certamente não podemos suster que os sentidos nos revelem num só golpe absolutamente tudo a respeito do objeto, esgotando-o por assim dizer (de modo que nada reste para ser aprofundado por eles). Por outro lado não julgo que não tenhamos razão suficiente para por em dúvida aquilo que é captado ou percebido.


D - "Os objetos encontram-se em estado de perpétua mudança na cor, temperatura, tamanho e movimento." o que é exposto por Sexto da seguinte maneira: "Assim a azeitona sendo verde quando nova torna-se escura quando madura e as próprias nuvens do céu mudam de cor conforme o evento ou revolução que prenunciam.". Agripa classifica este argumento como de RELAÇÃO.

M - Naturalmente que a partição do tempo sugere a partição dos eventos e sua decorrente sucessão.

Há séculos sabemos viver num universo dinâmico, isto é em movimento e não num universo estático ou fixo como supunham os adeptos da escola eleática e os povos bárbaros em geral.

Parece que o tempo deu razão a Heráclito... Este Heráclito sempre evocado como padrinho pelos relativistas e céticos de ontem e de hoje na medida em que negava toda e qualquer estabilidade postulando um devenir acelerado e absoluto: "Pantha rei" ou seja, tudo fluí, no perpétuo turbilhão do devenir... e sem que haja qualquer coisa de estável ou fixa.

E no entanto o tempo não lhe deu razão completa, a ponto de patentear sua teoria a respeito dum fluir absoluto.

O problema aqui não esta em admitir ou negar as sucessões e transformações mas sim em captar o ritmo das mesmas.

Na própria natureza há transformações que são bastante rápidas como a formação duma tempestade ou duma avalanche de neve; outras imprevistas até como terremotos e maremotos. E no entanto tais transformações não são contínuas ou mesmo cíclicas num sentido mais ou menos rápido, breve ou intenso.

Enquanto outras tantas comportam um ritmo ciclico bastante lento e para muito além da vida e geração do homem. De fato a natureza comporta grande número de eventos cíclicos, revoluções e ritmos a maioria dos quais no entanto não parecem corresponder a brevidade e a rapidez postuladas pelo 'obscuro' efesino.

Assim sendo mesmo nas transformações que alteram o Kosmos parece haver certa constância, ou certo período de repouso. Destarte podemos perceber muito bem a ponto de calcular e prever a fase ou o período de tempo porque passa determinado fenômeno e antever as transformações que se sucederão na fase seguinte porque tais mudanças não são aleatórias. E não sendo nem demasiado rápidas nem aleatórias podem ser captadas pelo aparelho sensorial e apreendidas pelo intelecto mesmo sob a condição de fases 'provisórias' o que, ademais, corresponde perfeitamente a realidade externa e objetiva de um Kosmos em movimento.

A percepção mesma dos movimentos, das fases, dos períodos, das transformações, etc parece opor-se tanto a idéia fixa a respeito dum universo fixo; quanto a ideia dum universo caótico e significa que ao menos alguma coisa somos capazes de perceber. A simples noção de movimento X repouso já supõe algum tipo de conhecimento válido e verdadeiro...

A idéia de que quando percebemos ou conhecemos uma coisa ela já se transformou noutra não passa dum espantalho bastante desengonçado. Do contrário ninguém beberia vinho cuidando ter já se transformado em vinagre... ou tomaria qualquer drink gelado, cuidando ter o gêlo evaporado num instante...

As transformações que envolvem a matéria  não parecem ser assim tão rápidas a ponto de impedirem que os sentidos captem certo estádio ou forma mais ou menos constante de ser ou existir.

Eis porque os fenômenos podem ser relacionados em termos de causa e efeito e expressos sob a forma de 'leis'... Sempre que água atingir 100 graus ferverá. Exposta a temperatura de zero grau solidificar-se-a... e assim por diante. A simples ideia de que tais relações ou leis jamais conhecem mudança ou alteração implica a existência de certa estabilidade ou imutabilidade no universo... ficando a sucessão, ao menos em parte estocástica, dos fenômenos; como que inserida na estrutura imutável das relações ou da lei natural.

Aqui Antonio Sérgio: "Segundo disse o velho Heráclito 'É impossível o mesmo homem mergulhar duas vezes no mesmo rio, pois nem ele é o mesmo nem o rio o é.' ... todavia no rio de hoje, cujas águas de fato não são as mesmas observo as mesmas leis hidráulicas que já havia observado antes; e no home que nele mergulhas as mesmas leis psicológicas. ASSIM AS RELAÇÕES SÃO ESTÁVEIS. Prestai atenção neste ponto que vos leva longe; e neste outro: QUANDO SUSTENTO QUE TUDO FLUI, SUSTENTO A EXISTÊNCIA DE ALGO QUE JAMAIS FLUI, A SABER; O ATO DE JUÍZO PELO QUAL AFIRMO 'TUDO FLUI'. DO CONTRÁRIO, SE ESTE JUÍZO FLUÍSSE TAMBÉM COMO SERIA VERDADE QUE TUDO FLUI?" in 'Ensaios' VIII, 244 sgs

Assim "A lei é o que há de fixo e imutável na fluência ou no perpétuo devenir dos fenômenos." completa Vasco de Magalhães Vilhena in 'Pequeno manual de Filosofia" p 519

O mesmo se dá com a acepção vulgar da 'Teoria da relatividade' de Einstein... caso ela implicasse relativismo de cárater subjetivo. Pois a própria teoria seria relativa a subjetividade daquele que a formulou, perdendo assim todo seu valor objetivo... Destarte o simples de Einstein ter formulado sua 'teoria' pertinente a relação tempo e espaço e afirmado sua validade ou existência no plano real, evidencia que o grande físico e gênio do passado século não partilhava do relativismo epistemológico ora predominante.



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