sexta-feira, 20 de março de 2009

Respostas as objeções formuladas pelos céticos.

D - Segundo leio em Montaigne Cícero condena alguns de seus amigos por cultivarem a astronomia, o direito, a dialética e a geometria; os da escola de Cirene desprezavam a física e a dialética; Zenão no prólogo da República declara inuteis todos os ramos da educação liberal; Crísipo afirma que Platão e Aristoteles escreveram sobre a lógica por distração, e não crê que pudessem levar a sério um assunto assim tão vazio; Plutarco condena a metafísica; Epicuro condena a retórica, a gramática, a poesia, a matemática e outras ciências. Sócrates igualmente as desprezava todas, afora as que tratam dos costumes e conduta da vida.

M - Parece que esgotastes toda tua erudição...

D - rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs

M - Cícero condenar o estudo do direito é no mínino exótico para não dizer cômico, quanto a condenar a Dialética... o mesmo se pode dizer a respeito de um cético que recorre ao 'argumento da autoridade'...

Talvez Cícero ignorasse que sem geometria Roma não teria erguido pontes e aquedutos por toda Europa... ou construído tão boas 'cloacas'...

Por outro lado sem tais aquedutos e pontes talvez viesse a faltar água para os céticos beberem ou suas viagens se tornassem bem mais demoradas... quanto a falta de cloacas imaginem só o odor nauseabundo que os filhos de Pirro teriam e inalar... e com eles o 'elegante' Cícero...

Quanto a Zenon condenar o estudo das artes liberais, por que raios teria escrito uma 'República'?

Tampouco nos importam as opiniões e crenças desse obscuríssimo Crísipo - cujas obras em sua maior parte se perderam - sobre os egrégios Platão e Aristóteles imortalizados justamente porque suas obras foram compostas tendo em vista um plano lógico e uma ordenção interna a que chamamos coerência.

É possivel que Plutarco não fosse capaz de dissertar sobre metafísica... ou que a metafísica de seu tempo estivesse já apodrecida... como a de Leibnitz criticada com toda justeza por Kant...

Quanto ao juizo de Epicuro, fosse ele levado a sério e não possuiriamos as obras imortais de Ovidio, Virgilio, Estácio, Juvenal, Catulo, Propércio, Marcial, Dante, Camões, Milton... Talvez ele tenha se esquecido de que Tales, Pitágoras e o próprio Platão, dentre outros, haviam se dedicado ao cultivo das matemáticas...

Tais Filósofos que me perdoem mas com E Renan, creio que Teofrasto, Straton, Dicearco, Eratostenes, Aristarco, Hiparco, Euclides e Arquimedes sozinhos prestaram mais serviços a humanidade, do que todos os céticos, relativistas, idealistas e diletantes de plantão...

Que seria da pobre humanidade caso algum deles tivesse dado ouvido as cantilenas de Crísipo, Zenon, Epícuro, Plutarco, Sexto, Pirro, Aenesidemus e outros faladores...

Mas estes - pelo contrário - admitiam a veracidade de nossas sensações e confiavam na reflexão, na ciência, na busca pela verdade e por isso observaram, pesquisaram, averiguaram, experimentaram e descobriram; inventando uma porção de técnicas que facilitaram imensamente a vida de seus contemporâneos...

Que Sócrates tenha se ocupado especialmente dos problemas referentes ao fenômeno humano (ele certamente faria sua a sentença do dramaturgo: 'Nada do quanto seja humano me é indiferente') - foi o primeiro humanista e por isso mesmo um marco na História da Filosofia - como o bem e o mal, a justiça, os valores, etc e enfatizado a importância dos mesmos face a tecnologia pura e simples ou mesmo a metafísica estamos todos estamos fartos de saber. Que tenha condenado como inúteis e vãos os demais terrenos ou áreas do conhecimento filosófico, ignoro-o supinamente e não sei donde Montaigne tirou tão caprichosa idéia. Pois uma coisa é condenar a 'Ciência sem consciência' ou desvinculada da ética e outra, totalmente distinta é condenar toda ciência ou o conhecimento empírico em si mesmo, coisa que Sócrates jamais fez.

De fato Sócrates fez uma espécie de recorte, optando por aprofundar-se num determinado domínio, seja a definição dos conceitos (que toca a gnoseologia) e a ética. Disto não decorre que tenham sustentado ou afirmado a inutilidade dos demais campos da grande seara filosófica...

Desde quando optar por um setor da realidade - tendo em vista sua enorme amplitude - e dedicar-se especialmente a ele implica condenar o estudo dos outros setores? Desde optar pelo magistério implica condenar os que cursam direito ou cursar direito implica negar a validade do curso de medicina???

O máximo que podemos dizer é que como qualquer um de nós Sócrates optou pelo tipo de conhecimento ou saber, com base em seus princípios, valores e inclinações encarava como sendo o mais nobre ou importante: o homem, seu comportamento e a elaboração dos conceitos. Que tenha apresentado os demais estudos no campo da Filosofia como inuteis ou perniciosos, insistimos, não passa de afirmação gratuita e disparatada.

Para Sócrates havia uma hierarquia de saberes, com relação a qual o auto-conhecimento ocupava o primeiro lugar. Segundo Sócrates o homem devia conhecer primeiramente e muito bem a si mesmo para só então devassar o universo... Consequentemente prioriza ele o psicológico e o axiológico face ao ontológico e o prático, sem todavia restringir a realidade a tais áreas... Hierarquiza, prioriza, humaniza, mas não faz do reducionismo ingênuo e tosco credo seu.

Tanto que Platão, seu discípulo, explorará todas as áreas da Filosofia dissertando a respeito de todos os temas e assuntos possíveis e Aristóteles, discípulo de Platão e fundador do Liceu, seguindo os passos de seu mestre, comporá cerca de oitenta obras que ainda temos bem conservadas e outras tantas das quais nos restam apenas fragmentos. Abordando, do mesmo modo que o acadêmico, diversos aspectos do pensamento filosófico.

Seja como for tanto um quanto outro priorizaram a ética e o conhecimento do universo valorativo (axiologia) face aos demais tipo de saber.

E mesmo assim, tendo em vista a vastidão do campo por eles devassado, foram cognominados sistemáticos.

Nada mais avesso ao ceticismo do que o espírito de sistema, pois o sistema supõe uma hierarquia ou ordem de verdades organicamente dispostas e torno de um determinado centro vital.

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